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No segundo dia do I Encontro de Segurança de Acervos Culturais (08/08), trouxe dois paineis. No primeiro painel, na parte da manhã, Leandra Pereira de Oliveira, chefe da Biblioteca do Museu Nacional (UFRJ), Cristina Tardáguila, jornalista, fundadora da Agência Lupa e autora do livro “A arte do descaso: a histório do maior roubo a museus no Brasil”, e Klaus Simões, investigador de Polícia da Unidade de Inteligência Policial do Departamento de Capturas e Delegacias Especializadas – Decade/Polícia Civil do Estado de São Paulo.
A primeira a falar foi Leandra Oliveira, com sua apresentação “A maior coleção de naturalistas do Brasil no bicentenário do Museu Nacional/UFRJ: casos de furtos e medidas protetivas”, com um breve histórico da Biblioteca Nacional, que tem todo o seu catálogo, mais de 400 mil obras doadas por personalidades, bibliotecas particulares, intercâmbio internacional de publicações e adquiridas pela Comissão Científica de Exploração, e etc., na base de dados Minerva, da UFRJ, e que inclui a maior coleção de naturalista do Brasil. A chefe da Biblioteca do Museu Nacional relatou casos de furtos que envolveram funcionários, usuários e quadrilha de ladrões especializados, como os que aconteceram com os livros The Natural history of Carolina, Florida and Bahamas Islands, de Catesby (1771), Grammaire égyptienne, de Champolion (1836), e os 24 livros raros dos séculos 16 a 20, como uma obra em latim de Hans Staden, datada de 1592, sobre índios do Brasil e da América do Sul – America tertia pars, e outro com fotos de D. Pedro II e a família imperial, de 1860, de Charles Ribeyrolles, dentre outras. Leandra Oliveira detalhou as medidas preventivas para evitar que outros furtos ocorram e mostrou algumas medidas que estão sendo tomadas pela Bibliioteca, como a busca de investimento do BNDES para manutenção do acervo e a criação de uma Biblioteca Digital de Obras Raras, parcerias institucionais com a Rede Memória Virtual Brasileira e a Rede BHL SciELO (Coleção de fontes de informação em biodiversidade).
A jornalista Cristina Tardáguila falou sobre o roubo do Museu da Chácara do Céu, em Santa Teresa, no Rio de Janeiro, ocorrido durante o Carnaval de 2006, no qual foram levados cinco obras de arte: “um Dalí, um Matisse, um Monet e dois Picassos, cujo valor estimado na época, ultrapassava 10 milhões de dólares”, conforme relata em seu livro “A arte do descaso: a história do maior roubo a museu do Brasil”. A jornalista destacou a “série de situações de descaso à época tanto da direção do Museu, do Ministério da Cultura, do Instituto do Patrimônio HIstórico e Artístico Nacional (IPHAN), da Polícia Federal” e até da grande imprensa – “Por que a mídia brasileira glamouriza o ladrão de arte? Será que isto não atrapalha a investigação?”, indagou à plateia. Cristina Tardáguila também resssaltou que o crime de roubo de arte é considerado pelo FBI (Federal Bureau of Investigation), dos EUA, o “terceiro crime mais lucrativo no mundo, ficando apenas atrás do tráfico de drogas e de armas”. Ela falou aos presentes que o roubo do Museu da Chácara do Céu continua sem solução e o crime “vai prescrever em 2026, o inquérito segue aberto” – “Enquanto o assunto for tratado com descaso, não acharemos as obras”, finalizou.
Fechando a manhã, Klaus Simões falou sobre “O furto de Obras Raras”, expondo a atuação da quadrilha de Laéssio Rodrigues de Oliveira, especializada em obras de arte. Simões foi o responsável pela prisão do ladrão e um comparsa. O policial explicou, de forma simples e clara, quais as características do furto de obras de arte. Segundo Simões, “é um crime que raramentel envolve violência, portanto é um furto e não um roubo. Além disso, ele não é realizado por uma questão de oportunidade – ou seja, o indivíduo não estava passando e achou que poderia roubar alguma coisa – é um crime planejado, que exige conhecimento e as quadrilhas sabem bem o que estão levando, é um crime que ocorre por encomenda”, afirmou. Ele também disse que há outras características, como o baixo risco e o alto retorno, a mutilação das obras, que é feita para facilitar o carregamento, e lembrou a todos, que “este tipo de crime só é possível, porque há um forte mercado nacional e internacional de aquisição de obras roubadas”. Klaus Simões alertou sobre o perfil dos criminosos, em geral, “especializados, com bom nível intelectual e inteligência acima da média” e pediu a todos que incluíssem em suas medidas de segurança, “um banco de dados dos suspeitos e que haja troca de informações entre as instituições” sobre os possíveis furtadores.
Fechando o último dia do Encontro, o segundo painel trouxe Domícia Gomes, arquivista e coordenadora de Apoio ao Conselho Nacional de Arquivos (Conarq)/Arquivo Nacional, Gilvânia Lima, conservadora restauradora, chefe do Centro de Conservação e Encadernação, da Coordenadoria de Preservação da Biblioteca Nacional, e, por fim, Antônio Carlos de Oliveira, museólogo e climatologista do Museu Nacional de Belas Artes (Ibram).
Domícia Gomes falou sobre a Câmara Técnica de Preservação de Documentos do Conarq, que tem por objetivo atender às demandas de normalização e criação de instrumentos “metodológicos, téncicos e normativos, visando à preservação dos acervos documentais dos arquivos públicos e privados”. A coordenadora de Apoio do Conarq esplicou que segurança – de forma geral – é um tema prioritário estabelecido pelo Conselho e implementado pela Câmara Técnica de Preservação de Documentos (CTPD). Neste âmbito, se inclui, por exemplo: segurança, no que tange à prevenção contra roubos; prevenção de sinistros (em seu Plano de Desastres), meio ambiente – o controle ambiental, temperatura, umidade, poluentes, luz, roedores, fungos e insetos. Algumas das funções da CTPD é aplicar as recomendações para a construção de arquivos – orientando o planejamento para a construção, adaptação e reforma de edifícios; para a produção e o armazenamento de documentos de arquivo e mesmo o resgate de acervos arquivísticos danificados por água. Segundo Domícia Gomes, a Câmara Técnica elaborou um plano de trabalho trienal (2018-2019-2020) que leva em consideração diversos pontos antes não abordados, com um enfoque em questões de meio ambiente – o studo de sistemas passivos e mecânicos de climatização de baixo custo de implantação e baixo consumo energético; identificação de plantas repelentes de insetos e sua eficácia para serem plantadas em áreas externas aos locais de guarda de acervo; ou em relação à saúde do trabalhador – monitoramento e controle de infecções por meio de um protocolo de procedimentoss e exames laboratoriais nos profissionais que lidam com o patrimônio documental, por exemplo.
Em seguida, foi a vez de Gilvânia Lima, que apresentou “Conservação preventiva em processos de exposições”, mostrando a implantação da Normativa FBN nº 001, de 26/01/2016, na qual são estabelecidos “prazos e normas institucionais para o empréstimo do acervo para exposições e que determinam sanções caso estas normas não sejam atendidas”, explicou. A Biblioteca Nacional cede obras para exposições externas. Dentre as normas, há um prazo mínimo de três meses para a solicitação do acervo em relação à data de exibição, com uma limitação da quantidade de itens por coleção em 49%, e especificações técnicas e materiais de moldura e garantia de parâmetros ambientais, com envio de relatórios climatológicos. Segundo Gilvânia Lima, as obras cedidas podem ficar até três meses em exposição fora da Biblioteca Nacional. Ela informou que “nenhuma obra sai da FBN sem estar digitalizada e com um laudo técnico de seu último estado físico”. A conservadora restauradora também falou que a Biblioteca Nacional está produzindo réplicas – cópias de original – de algumas obras raras para algumas exposições. “Existe um tabu em se expor um fac-símile ao invés do original. Mas, isto pode ser feito para não expor o acervo, por questões de segurança”, concluiu.
Em sua apresentação, “Modelagem de valoração de objetos bibliográficos para preservação do patrimônio”, Antônio Oliviera falou da necessidade de se “valorar um objeto, o que garante uma energia potencial para que ele passe pelo processo de catalogação e, ao final, torne-se um documento de fato”. O museólogo lembrou que é importante definir o objeto como um modelo, “para a compreensão de seu contexto histórico, para a valoração pela sociedade local que o possui, além da possiblidade da comparação entre coleções, acervos e suas representações sociais, local, regional e global”. Oliveira explicou como se determina a valoração para registro e tombamento de uma obra, mostrando as categorias, a tabela de atributos, a matriz de aderência e ressonância, a significância para valoração do tombamento/registro e etc. Ele esclareceu que “raridade e preciosidade são os dois critérios principais que caracterizam as peças do acervo de Obras Raras, oriundas de diversas coleções da própria Biblioteca Nacional. Para integrar este conjunto, não basta que a obra seja antiga, é preciso também que seja única, inédita, faça parte de alguma edição especial ou apresente algum traço de distinção. Pode ser uma encadernação de luxo ou o autógrafo de uma celebridade”, disse.
O evento terminou com “um gostinho de quero mais” em todos os que participaram. Ainda sem data prevista, um novo encontro, até pelo recorde de inscrições, mais de 150, mostrou que discutir segurança dos acervos é fundamental para a preservação e conservação desses mesmos acervos. Ao final, um coquetel de confraternização reuniu todos os presentes.
Leia também a prinmeira parte da cobertura do I Encontro de Segurança de Acervos Culturais aqui
Créditos:
Fotos: Gilmar Moraes - Preservação/Icict | Montagem 1: Graça Portela - Ascom/Icict
Fotos: Rodrigo Méxas - Multimeios/Icict | Montagem 2: Graça Portela - Ascom/Icict
Assista aqui os vídeos do segundo dia de palestras:
I Encontro de Segurança de Acervos Culturais 08/08/2018 parte I
I Encontro de Segurança de Acervos Culturais 08/08/2018 parte II
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