Fiocruz e Unifase participam de missão internacional na Europa com foco em direitos humanos e inclusão social das pessoas com deficiência

por
Roberta Raupp (InMedia/Nippis)
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06/09/2023

Crédito: Agência Senado | Autor: Cesar Brustolin/SMCS

Em maio de 2023, Cristina Rabelais, coordenadora do Núcleo de Informação, Políticas Públicas e Inclusão Social (NIPPIS) e Maria Fernanda Bittencourt, pesquisadora do Núcleo e professora da Unifase, passaram pela Islândia, Suíça, Irlanda e Portugal, onde visitaram instituições que atuam na área das pessoas com deficiência, apresentaram trabalhos e participaram de um importante evento internacional: a 16ª reunião bianual da Rede Nórdica de Pesquisa sobre Deficiência (Nordic Network Disability Research - NNDR). 

As pesquisadoras buscavam um intercâmbio de conhecimentos com ênfase em dimensões culturais, sociais e ambientais sobre deficiência e marginalização, numa iniciativa conjunta do Instituto de Comunicação e Informação Científica e Tecnológica em Saúde (Icict/Fiocruz) e do Centro Universitário Arthur de Sá Earp Neto (Unifase).

“Nosso objetivo principal foi dar mais visibilidade aos projetos desenvolvidos pelo NIPPIS, trocar experiências e firmar parcerias com os países visitados, que também têm um olhar diferenciado para o universo das pessoas com deficiência. A experiência, sem dúvida, foi primordial para aprimorarmos as nossas potencialidades e refletirmos sobre os desafios que giram em torno dessa área, não apenas no Brasil, mas em todo o mundo”, destaca Cristina, que é pesquisadora do Icict/Fiocruz e professora da Unifase. Nesta entrevista, ela conta como foi a participação na conferência da NNDR, na Islândia, e a articulação do NIPPIS com os países visitados.

Como foi a participação do NIPPIS na 16ª reunião bianual da NNDR?

O NIPPIS já tem um histórico de participação ativa nas reuniões da NNDR desde 2017, que é um espaço internacional de compartilhamento de experiências e de ampla discussão sobre a área dos direitos da pessoa com deficiência. Para se ter uma ideia do alcance mundial desse evento, foram recebidas contribuições de 43 países, incluindo 550 apresentações orais, que foram distribuídas em 125 sessões, e 60 trabalhos no formato de pôsteres. Com toda certeza, o encontro permitiu ao NIPPIS dar mais um passo em nossa missão de trabalhar com informação para a tomada de decisão, com ênfase na inclusão social das pessoas com deficiência.

Hoje o Núcleo se dedica a desenvolver sua atuação com foco na interseção entre as áreas da Informação e da Comunicação, no sentido de divulgar e fazer circular o conhecimento construído com linguagem apropriada para a compreensão da população, dos gestores públicos e dos demais atores interessados na temática. Outro ponto importante para nós é a área da Cultura, uma vez que entendemos que respeitar e valorizar os aspectos culturais das pessoas com deficiência está diretamente relacionado ao fortalecimento de inserções sociais de grupos historicamente excluídos, como é o caso das pessoas com deficiência.

Nesse contexto, a 16ª reunião da NNDR representou uma grande janela de oportunidades para levar o nosso conhecimento produzido, por meio de dois trabalhos aprovados para apresentação oral, o que evidencia a amplitude de espaço de fala para nós, pesquisadores brasileiros, quando comparamos à nossa participação nos encontros anteriores. Os projetos que apresentamos foram: o Sistema Nacional de Informações sobre Deficiência (SISDEF), no campo da Informação em Saúde, que hoje disponibiliza mais de cem indicadores sobre políticas públicas relacionadas às pessoas com deficiência nas áreas dos direitos humanos e sociais, educação, saúde e trabalho, além de diferentes bases de dados a serviço da sociedade; e o programa Ecoar – Diálogos de Cidadania, relacionado à Comunicação e Saúde, que já está em sua 16ª edição.

Esse último produto do NIPPIS consiste em um programa de entrevistas com especialistas na área, com ou sem deficiência, e recebe o apoio da equipe técnica da Secretaria Nacional dos Direitos da Pessoa com Deficiência (SNDPD) do Ministério dos Direitos Humanos e da Cidadania. Vale destacar que todos os episódios prezam pelo uso da linguagem simples para a disseminação do conhecimento produzido e disponibilizado no SISDEF, além de contar com recursos de acessibilidade, incluindo autodescrição, feita pelos participantes do programa, interpretação em Língua Brasileira de Sinais (Libras) e estenotipia (legendagem em tempo real). Além disso, como parte do Ecoar, compartilhamos no evento as métricas dos vídeos curtos disponibilizados nas redes sociais da Fiocruz, do Icict e da Unifase, que abordam em seus conteúdos a tradução de termos e jargões comuns à área da deficiência, mas que podem não ser de fácil entendimento para o público em geral.

O que o NIPPIS considera como ganhos a partir de uma colaboração com instituições acadêmicas internacionais? 

Os países nórdicos, em termos de legislação e direitos humanos das pessoas com deficiência, são muito avançados em relação às discussões das políticas públicas, e uma das razões se deve ao fato de a expectativa de vida das populações estarem entre as mais altas do mundo. Por isso, a interlocução com esses países sempre nos despertou interesse, além de poder dar visibilidade à nossa atuação brasileira na área, visto que o Brasil tem sido destaque mundial nos estudos sobre as pessoas com deficiência. 

Temos como exemplo de iniciativa de sucesso em nosso país o processo avaliativo da deficiência para a elegibilidade ao Benefício de Prestação Continuada (BPC), que foi uma das primeiras políticas em termos mundiais para incorporar a avaliação baseada na Classificação Internacional de Funcionalidade, Incapacidade e Saúde (CIF), uma ferramenta da Organização Mundial de Saúde (OMS) criada em 2001. Isso representou um avanço extraordinário para a nossa área porque a CIF propõe o rompimento com o que preconiza o modelo de avaliação da deficiência baseado apenas nas características físicas e nas limitações, ampliando o conceito e a forma de pensar nas políticas públicas. 

Além disso, o Brasil é signatário da Convenção sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência, promovida pela Organização das Nações Unidas (ONU) em 2006. Dessa forma, o grande desafio para as políticas públicas, e que faz parte da missão do NIPPIS, está na demolição das barreiras e na criação de facilitadores para a aceitação dos corpos, para que as pessoas consigam, com as suas características próprias, interagir na sociedade com igualdade de condições e direitos. 

Nesse cenário, podemos mencionar como um dos pontos de destaque da nossa missão a possibilidade de firmar um acordo de associação com o Observatório da Deficiência e Direitos Humanos, na Universidade de Lisboa, que contempla todos os países de língua portuguesa. Também estamos trabalhando na construção de uma agenda de trabalho conjunto e colaborativo com a Universidade de Lisboa, com a expectativa de participar de eventos ainda em 2023, com o intuito de compartilhar a experiência brasileira e a produção do conhecimento em favor das pessoas com deficiência.

Quais as diferenças e semelhanças entre o que tem sido produzido nos países visitados e o Brasil em relação às políticas públicas para as pessoas com deficiência? 

Cristina Rabelais: Como parte da missão institucional do NIPPIS, além da nossa participação na NNDR, que aconteceu na Islândia, tivemos a oportunidade de visitar instituições de pesquisa associadas ao Disability Advocacy Research in Europe – DARE, uma organização que reúne institutos que trabalham com pesquisa em prol dos direitos das pessoas com deficiência nos países europeus. Durante as visitas institucionais, observamos diferentes graus de aderência aos projetos que desenvolvemos no NIPPIS. 

Na Suíça, por exemplo, os pesquisadores do Swiss Paraplegic Research se aproximaram da nossa atuação pela abordagem da deficiência enquanto experiência de vida e a partir do modelo estabelecido pela Convenção dos Direitos das Pessoas com Deficiência. Já na University Of Galway, na Irlanda, a forte adesão ocorreu pelo eixo da Comunicação, com o programa Ecoar, visto que o trabalho realizado por eles se vincula ao desenvolvimento da autonomia e à inclusão das pessoas com deficiência como protagonistas na tomada de decisão na formulação de leis do país. 

Em Portugal, tanto o SISDEF como o Ecoar tiveram adesão, uma vez que o Observatório da Universidade de Lisboa atua nos dois eixos – de produção de informação para monitoramento dos avanços e cumprimento dos direitos da pessoa com deficiência, e ações semelhantes ao que acontece no Ecoar, com a participação e envolvimento de segmentos e atores atuantes em favor dos direitos das pessoas com deficiência. Em contrapartida, o conhecimento produzido pelas instituições internacionais trouxe ricas contribuições para o NIPPIS em relação às linhas de pesquisa e as formas de atuação na área.

É importante enfatizar que o que sempre chama a nossa atenção como um grande diferencial brasileiro no exterior é a profusão de sistemas de informação em acesso aberto que existem no Brasil. Temos uma característica histórica que é em relação ao quantitativo expressivo de bancos de dados desenvolvidos em diversos setores, inclusive na Saúde. Devido a essa diferença, tivemos que apresentar o contexto de produção científica no Brasil, antes de falar propriamente sobre o SISDEF. Isso é algo muito positivo e raro, porque ainda são poucos os países que têm o acesso à informação como o Brasil têm.

Quais as expectativas a curto, médio e longo prazo para os próximos trabalhos do NIPPIS? 

Ao pensarmos em Comunicação e Informação em Saúde, temos a clara compreensão de que precisamos ir além da produção da informação científica, de maneira que ela circule e seja apropriada de forma adequada pela população. No NIPPIS, a nossa expectativa é trabalhar com duas vertentes: a produção de evidências por indicadores quantitativos, que já vem sendo materializada pelo SISDEF, e produção de evidências a partir da literatura científica, para apoiar a tomada de decisão sobre políticas públicas, traduzindo o conhecimento para os gestores.

Sobre o SISDEF

O Sistema Nacional de Informações sobre Deficiência (SISDEF) é um sistema de informações composto por um conjunto de painéis de indicadores, desenvolvido em plataforma de tecnologia de informação e análises de dados, em acesso aberto e universal, destinado ao monitoramento de políticas públicas voltadas para essa área. Trata-se de um sistema dinâmico, em permanente atualização, que utiliza bases de dados oficiais como fontes para a elaboração de indicadores. Tem por objetivo final produzir e publicizar, com recursos de acessibilidade, indicadores confiáveis para o monitoramento das condições de vida, bem-estar e direitos humanos da população com deficiência, de modo a orientar ações e estratégias de organização social e políticas públicas. 

O processo de desenvolvimento do SISDEF é dinâmico, pois trabalha com a incorporação gradual e atualização sistemática de indicadores construídos a partir da inclusão de novas fontes de dados e da intersecção entre elas, considerando a perspectiva biopsicossocial de deficiência proposta pela OMS. Para acessar a plataforma visite: https://nippis.icict.fiocruz.br/sisdef

Sobre o programa Ecoar

O projeto cultural-informativo “Ecoar – Diálogos de Cidadania” é apresentado por Tuca Munhoz, e produzido por Clava Vale, Cristina Rabelais, Cristina Ruas, Daniele Novaes e Manoel Negraes. Apoiado pelo SISDEF, a iniciativa faz parte da estratégia de divulgação de informações e tradução do conhecimento para a implementação de políticas públicas e empoderamento da população, com foco no segmento de pessoas com deficiência e em temáticas de inclusão social. 

 

Créditos das imagens

Cristina Rabelais - coordenadora do Nippis | Foto: Divulgação

Cristina Rabelais e Maria Fernanda Bittencourt - pesquisadoras do Nippis e professoras da Unifase & pesquisadoras do Institute Lifecourse and Society, da Universidade de Galway (Irlanda)

 

 

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Laboratório de Informação em Saúde - LIS

Atua na geração e divulgação de informações para a formulação de políticas públicas e monitoramento do sistema de saúde, da situação de saúde da população brasileira e seus determinantes sociais e ambientais.

Para saber mais

Instituto de Comunicação e Informação Científica e Tecnológica em Saúde (Icict/Fiocruz)
Av. Brasil, 4.365 - Pavilhão Haity Moussatché - Manguinhos, Rio de Janeiro
CEP: 21040-900 | Tel.: (+55 21) 3865-3131 | Fax.: (+55 21) 2270-2668

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