‘A pauta dos direitos humanos precisa ser debatida e atualizada de forma permanente’

por
Daniele Souza
,
20/11/2018

Direito à vida. Liberdade. Segurança. Justiça. Liberdade de expressão e opinião. Direito ao trabalho e à instrução.  Serviços sociais. Estes são alguns dos direitos listados nos 30 artigos da Declaração Universal dos Direitos Humanos (DUDH), que completa 70 anos em 2018. 

A declaração buscou um ideal comum, a ser atingido por todos os povos e as nações, colocando os direitos humanos como uma questão mundial. O objetivo foi a promoção do respeito a direitos e liberdades e a adoção de medidas nacionais e internacionais, por meios das quais os direitos humanos fossem assegurados.

Desde a sua adoção, a DUDH foi traduzida para mais de 500 idiomas e inspirou as constituições de muitos Estados e democracias. No Brasil, não foi diferente: assim como outros direitos destacados, a dignidade da pessoa humana, valor intrínseco da declaração, e os direitos sociais estão presentes na Constituição Federativa do Brasil, de 1988,  nos fundamentos da República e em objetivos, como a construção de uma sociedade livre, justa e solidária.

Rodrigo Murtinho, diretor do Icict, explica que as reflexões foram amplas, em 2018, em temas como a violência e o direito à vida; o direito à saúde diante dos 30 anos do Sistema Único de Saúde e dos 40 anos da Declaração de Alma-Ata; os direitos à comunicação e à informação, em diferentes contextos; os efeitos das políticas de austeridade fiscal nas políticas sociais: “A pauta dos direitos humanos precisa ser debatida e atualizada de forma permanente. Reflete as contradições que vivemos em cada momento histórico". Com o propósito de discutir a importância da Declaração Universal dos Direitos Humanos para as sociedades contemporâneas e sua atualidade, 70 anos depois, o Icict realiza, em 28/11, um seminário, a partir das 9h, no Salão de Leitura da Biblioteca de Manguinhos, na Fiocruz. Confira a Programação.

Direitos humanos

Os direitos humanos são indivisíveis, inter-relacionados, interdependentes. Organicamente relacionados, todos devem ser vistos com igual importância; na prática, a violação de um direito afeta o respeito por muitos outros. São direitos inerentes aos seres humanos, sem importar raça, sexo, nacionalidade, etnia, idioma, religião ou outra condição. Direitos necessários para uma vida baseada em liberdade e dignidade, em uma sociedade democrática.

História

Um marco na história dos Direitos Humanos, a Declaração Universal surgiu no momento de uma nova ordem social e econômica. O mundo enfrentava as dificuldades do pós-guerra, com o fim da Segunda Guerra Mundial, em 1945. A ameaça de destruição pelo uso de bomba atômica tinha sido uma realidade, assim como campos de concentração e de extermínio, genocídios, com a estimativa de mais de 60 milhões de mortos e a destruição de diversos países. 

No que diz respeito a injustiças e atrocidades, outros documentos nacionais já tinham sido produzidos, como a Declaração de Direitos inglesa, em 1689, após as guerras civis. Ou a Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão, em 1789, após a Revolução Francesa. 

“Considerando que o desprezo e o desrespeito pelos direitos humanos resultaram em atos bárbaros que ultrajaram a consciência da humanidade e que o advento de um mundo em que mulheres e homens gozem de liberdade de palavra, de crença e da liberdade de viverem a salvo do temor e da necessidade foi proclamado como a mais alta aspiração do ser humano comum (..)” – preâmbulo DUDH

Proclamada pela Assembleia Geral das Nações Unidas, em Paris, na data de 10 de dezembro de 1948, por meio da Resolução 217 A III, a DUDH, de forma pioneira, estabelece a proteção universal dos direitos humanos. 

No intuito de encontrar um ponto de consenso amplo, a declaração não só conjugou diversas correntes políticas, como reafirmou diferentes direitos – de liberdade, de igualdade, de solidariedade, civis, políticos, econômicos, sociais, culturais – e os estendeu a sujeitos excluídos, como mulheres, defendendo o direito dos estrangeiros e proibindo a escravidão.

A DUDH é um desdobramento da Carta das Nações Unidas, documento de fundação das Organizações das Nações Unidas (ONU), organização internacional, formada voluntariamente por diferentes países, para não permitir outras atrocidades, como aquelas ocorridas durante a Segunda Guerra. A Carta da ONU expressa seus ideais e propósitos, para trabalhar pela paz, pelo desenvolvimento mundial e reafirmar direitos fundamentais.

A criação da ONU proporcionou um fórum para discussão, desenvolvimento e adoção de instrumentos internacionais de direitos humanos. Entre eles, a Comissão sobre os Direitos Humanos, órgão-chave da ONU, responsável pelos direitos humanos, até a substituição pelo Conselho de Direitos Humanos, em 2006. A Comissão, em 1946, foi responsável pela elaboração da Declaração Universal dos Direitos Humanos, na presidência da delegada dos Estados Unidos na ONU Eleanor Roosevelt. A partir de então, além da própria declaração, uma série de tratados internacionais de direitos humanos, instituições e instrumentos foram criados, conferindo um aspecto legal a esses direitos humanos. 

Ações posteriores

A Declaração Universal dos Direitos Humanos; o Pacto Internacional dos Direitos Civis e Políticos e dois Protocolos Opcionais (sobre procedimento de queixa e pena de morte); e o Pacto Internacional dos Direitos Econômicos, Sociais e Culturais e o Protocolo Opcional formam a Carta Internacional dos Direitos Humanos. Elaborados pela Comissão de Direitos Humanos, esses pactos internacionais se tornaram lei internacional em 1976. 

Diversos tratados e instrumentos internacionais de direitos humanos expandiram o corpo do direito internacional dos direitos humanos, abordando populações e abusos específicos, como tortura, refugiados e discriminação racial. Neste escopo, estão incluídas a Convenção para a Prevenção e a Repressão do Crime de Genocídio (1948), a Convenção Internacional sobre a Eliminação de Todas as Formas de Discriminação Racial (1965), a Convenção sobre a Eliminação de Todas as Formas de Discriminação contra as Mulheres (1979), a Convenção sobre os Direitos da Criança(1989) e a Convenção sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência (2006), entre outras.

Alma-Ata

A necessidade de ações voltadas para promoção de saúde de todos os povos do mundo também foi expressada na Declaração de Alma-Ata. O documento é o resultado da Conferência Internacional sobre Cuidados Primários de Saúde, evento da Organização Mundial de Saúde, realizado em 1978, na URSS. Em dez pontos, é marcado o caráter fundamental da Atenção Primária à Saúde, no intuito de reduzir as desigualdades em relação à saúde, pelo mundo. 

Relatório McBride

A discussão sobre a liberdade de opinião e expressão também foi além do artigo 19 da DUDH. Ao encontro dos debates promovidos pela Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura (Unesco) sobre uma Nova Ordem Mundial da Informação e Comunicação, surgiu a compreensão da comunicação como um direito.  Em um processo voltado para valorização desse direito, o relatório McBride, publicado pela Unesco em 1980, evidenciou o desequilíbrio nos fluxos de informação mundiais e a concentração nos meios de comunicação.
 

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