Coordenadora do Sinitox fala sobre a suspensão da reavaliação de agrotóxicos

por
Igor Cruz
,
21/07/2008

A coordenadora do Sistema Nacional de Informação Tóxico-Farmacológicas (Sinitox) da Fiocruz, Rosany Bochner, foi entrevistada para sítio do Icict sobre a liminar que suspendeu a reavaliação de agrotóxicos. A reavaliação seria realizada pela Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) que se apóia no decreto 4074/02. De acordo com o documento, cabe ao ministério da saúde reavaliar o registro de agrotóxicos, quando surgirem indícios da ocorrência de riscos que desaconselhem o uso de produtos registrados, bem como quando o País for alertado, por organizações internacionais responsáveis pela saúde, alimentação ou meio ambiente, das quais o Brasil seja membro integrante ou signatário de acordos.  A coordenadora do Sinitox é formada em estatística, doutora em saúde pública e pesquisadora do Instituto de Comunicação e Informação Científica e Tecnológica em Saúde (Icict) da Fiocruz.

Repórter: Como está a atual situação do Brasil em relação a consumo de agrotóxicos?

Rosany: O Brasil é o 2º maior consumidor de agrotóxicos do mundo. O que se consome de agrotóxicos é desproporcional à quantidade de alimentos. As pessoas não têm informações para saber usar agrotóxicos de maneira adequada. Quem está usando ou manipulando esses agrotóxicos, são pessoas que não sabem ler, não conhecem toxicidade, fazem aplicação sem blusa, sapatos e etc. Então essa estrutura é totalmente desorganizada.

Repórter: Quais são os principais danos que os agrotóxicos podem causar à saúde?

Rosany: Intoxicações agudas graves em trabalhadores e em pessoas expostas acidentalmente a esses produtos. Outro aspecto muito relevante, são as intoxicações crônicas, ou seja, são aquelas em que há uma exposição por um longo período de tempo, em que os sintomas ficam “mascarados” e que podem causar problemas sérios de saúde, como câncer, alterações hormonais, má-formação fetal, entre outros. Até mesmo uma pessoa que não trabalhe com agrotóxicos, mas que se alimenta com produtos que tenham essas substâncias, pode adquirir essas doenças.

Repórter: Por que muitos agrotóxicos utilizados aqui no Brasil não podem ser usados em outros países?

Rosany: Como há proibição de muitos produtos com agrotóxicos, principalmente, na Europa, Estados Unidos e China, as empresas acabam vindo para o Brasil, onde a demanda é muito grande, já que a comercialização desses produtos é liberada. Os produtos são “empurrados” porque nesses países, a legislação não permitiu sua comercialização. E se não foram aceitos lá, por que deveriam ser aceitos aqui? A saúde do brasileiro é diferente?

Repórter: Já que esses agrotóxicos estão sendo utilizados “legalmente”, por que as empresas não querem que eles sejam reavaliados?

Rosany: É importante ressaltar que essa reavaliação está sendo feita com base legal, por meio da lei 7.802/89 e do decreto 4074/02, que garante à Agencia Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) a realização da reavaliação. O sindicato das empresas de agrotóxicos alega que deveria participar do processo de reavaliação, só que esta reavaliação é uma questão técnica, os fabricantes não tem esse direito. Logicamente, as empresas não querem participar da reavaliação; na verdade, elas não querem que os produtos sejam proibidos e saiam do mercado, ou que haja uma troca de formulação. A Anvisa não tem interesse comercial nenhum na proibição dos agrotóxicos, mas as empresas têm um interesse enorme nisso. Do lado da Anvisa, está a saúde da população e do outro lado estão as empresas.

Repórter: A senhora é contra o uso de agrotóxicos?

Rosany: O ideal é que se tenham plantações sem agrotóxicos, mas já que é necessário, devido à produção em grande escala, que se faça o uso racional. Nós trabalhamos para, um dia, termos uma agricultura livre de substâncias que podem ser perigosas para o homem e o meio ambiente. Entretanto, o modelo agrícola atual com extensos plantios de uma mesma variedade, de uma mesma planta, com baixa resistência a pragas e doenças, torna a produção ainda dependente dos agrotóxicos. Portanto, não se trata de ser contra, mas sim, de informar que a agricultura conta hoje com inúmeros produtos e manejos que podem garantir a produção com a redução da contaminação dos trabalhadores, do meio ambiente e do consumidor.

Repórter: Como está a incidência de intoxicação por agrotóxicos em relação a outros agentes tóxicos?

Rosany: Os agrotóxicos estão em 3º lugar no total de causas de intoxicação, mas estão em 1º lugar em relação à letalidade. A cada 100 casos de intoxicação por agrotóxicos, três pessoas morrem. As intoxicações por agrotóxicos de uso agrícola são os que mais fazem vítimas, e aparecem, principalmente, de três formas: acidental, ocupacional e tentativa de suicídio. Quando se fala em tentativa de suicídio, há uma predominância do sexo masculino, via intoxicação por agrotóxicos, já as mulheres, usam medicamentos. Outro problema é o chumbinho, um agrotóxico de uso agrícola, que é desviado para as cidades e vendido para matar ratos. Isso provoca muitos acidentes, principalmente com crianças.

 

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