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Em um artigo publicado no último dia 29/06, o pesquisador Helio Kuramoto, um dos maiores especialistas no país sobre acesso aberto, elogiou a iniciativa e o pioneirismo da Fiocruz em estabelecer a sua Política de Acesso Aberto. Nessa entrevista, o pesquisador faz um breve histórico da Política de Acesso Aberto no país, fala do novo papel das bibliotecas e de como os pesquisadores só terão a ganhar com essa Política.
Quando elaborei aquele post em meu blog, não o fiz para fazer qualquer elogio leviano, mas porque a Fiocruz estabeleceu uma política em concordância com os preceitos designados pela declaração BOAI (Budapest Open Access Initiative), cuja primeira estratégia estabelecia o uso do conceito de autoarquivamento (do inglês, self archiving). Ou seja, desde o seu início, o movimento Open Access (OA) preconizou que os próprios pesquisadores fizessem o autoarquivamento de sua produção científica. No Brasil, as instituições de ensino superior preferiram indicar as bibliotecas universitárias como responsáveis por esse depósito, e isto provoca a necessidade de o autor assinar uma autorização para que as bibliotecas o façam em seu lugar.
Obviamente, nem todas as bibliotecas seguiram o mesmo caminho. Entretanto, o método comum predominante no Brasil preconiza esse depósito por parte das bibliotecas universitárias, poupando os autores dessa atividade, que foi adotada mundialmente. É preciso entender o papel de cada ator nesse processo. O autor ou pesquisador é uma pessoa altamente capacitada e capaz de executar essa tarefa.
O futuro do Acesso Aberto depende dessa medida. Um fato importante relacionado a essa forma de depósito é que o autor ou pesquisador ao fazer ele próprio o depósito de sua produção científica, além de agilizar o povoamento dos repositórios digitais, ajuda na ampliação da visibilidade da sua produção científica, sem depender de quem quer que seja.
Acredito que, quando o pesquisador perceber os benefícios do autoarquivamento, eles não hesitarão em adotá-lo. Trata-se de algo novo para eles e somente a prática poderá mostrar as vantagens desse procedimento.
Na medida em que a Fiocruz vier a adotar a prática do autodepósito e os resultados começarem a aparecer – ou seja, o ganho de visibilidade da produção científica depositada no repositório Arca – com certeza esse será um fato novo para a comunidade científica.
Hoje, temos o Google Scholar, que mostra de forma mais fácil a visibilidade de um paper. Nos últimos quatro, cinco anos, o Google começou a indexar também os repositórios digitais de uma forma geral e isto proporcionou a qualquer pesquisador conhecer a visibilidade de sua produção científica. Experimente acessá-lo e veja a visibilidade de seus papers. É uma experiência agradável e surpreendente. Há alguns anos, depositei um artigo que publiquei na revista "Ciência da Informação" e, desde então, acompanho a quantidade de citações que esse artigo tem recebido. Fiz o mesmo com outros artigos que publiquei e tem sido uma grata satisfação verificar que esses artigos, que se encontram depositados em um repositório temático para área da ciência da informação e áreas afins, o e-Lis, têm sido acessados e citados.
Quando submetemos o projeto de construção de repositórios à Finep, a nossa ideia era a criação de um portal que pudesse integrar todos os repositórios digitais no país, de forma que o globo terrestre poderia acessar toda a produção científica brasileira. Quando me aposentei do Instituto Brasileiro de Informação em Ciência e Tecnologia (IBICT), havia um grupo de técnicos estudando a criação desse portal. Soube há algum tempo que o IBICT teria construído esse portal. Entretanto, não tenho maiores informações.
Sempre achei que as bibliotecas brasileiras, especialmente as bibliotecas universitárias, desempenhariam papel fundamental na questão da implementação do Acesso Livre no país, e continuo acreditando nisso, apenas não concordo que essas bibliotecas se reduzam a simplesmente depositarem a produção científica dos nossos pesquisadores.
Elas podem assumir uma função mais importante, que é a gestão dos repositórios institucionais e a proposição de serviços de informação, não apenas para a comunidade científica em geral mas, especialmente, para a sociedade civil brasileira. Nesse quesito, há muito ainda que se criar e se desenvolver. As tecnologias da informação e da comunicação estão aí disponíveis para dar suporte a essa tarefa.
Bem, na realidade eu venho defendendo as iniciativas de acesso aberto desde 2003, quando o IBICT implantou a Biblioteca Digital de Teses e Dissertações e, posteriormente, quando traduziu e distribuiu o software OJS – Open Journal System, que no Brasil recebeu a denominação de Sistema Eletrônico de Editoração de Revistas (SEER) e promoveu a construção de diversos periódicos científicos e portais de periódicos científicos no País.
Hoje, o Brasil é considerado o segundo maior país em termos de revistas científicas de acesso livre, ficando atrás apenas dos Estados Unidos. Conseguimos com essa ação criar uma alternativa ao SciELO, que era a única iniciativa que possibilitava a criação de revistas científicas eletrônicas. Atualmente, o Brasil oferece duas alternativas para a criação de revistas científicas eletrônicas de acesso aberto, o SciELO e o SEER.
Após essas iniciativas serem implantadas, elaboramos – eu e a professora Sely Costa – o Manifesto Brasileiro de Apoio ao Acesso Livre e o lançamos em setembro de 2005 em uma videoconferência promovida pelo Ibict com o apoio da RNP – Rede Nacional de Educação e Pesquisa, na qual contamos com a participação de diversos pesquisadores localizados em diversas cidades brasileiras, inclusive com a participação do presidente da Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência (SBPC), professor Ennio Candotti.
Em seguida, articulamos junto ao Ministério da Ciência e Tecnologia (MCT) a submissão de dois projetos junto à Finep, com o propósito de obter recursos para a construção de repositórios digitais no país. Desses dois projetos resultaram alguns repositórios que hoje se encontram em operação no Brasil.
No ano de 2007, articulamos junto ao ex-deputado Rodrigo Rollemberg a submissão do projeto de lei 1120/2007, que foi arquivado em 2011. Posteriormente, articulamos junto ao atual senador da república Rodrigo Rollemberg o Projeto de Lei do Senado PLS 387/2011, que corre o risco de seguir o mesmo caminho do PL 1120/2007.
Esses dois fenômenos apenas mostram o quão fraca é a nossa comunidade científica, ou, certamente, a ignorância de nossos pesquisadores, que poderiam contribuir na articulação da classe política. Este é o estágio do Acesso Aberto, que pessoalmente prefiro chamar de Acesso Livre, pois o Acesso Aberto não representa nada, apenas mostra que o caminho está aberto, enquanto que o Acesso Livre designa que o acesso é livre de custos, portanto, esta última expressão é para mim mais representativa dos seus objetivos.
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