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Nos próximos meses, o Brasil se organiza para calcular estimativas de carga de doença em níveis subnacionais (por estado da Federação). Trata-se de um esforço científico sistemático em prol da identificação, coleta, armazenamento e governança de dados e informações, a partir de publicações científicas, redes sociais ou de bancos de dados nacionais e internacionais, para torná-los disponíveis a gestores, governos e autoridades de saúde responsáveis pela elaboração de políticas de prevenção ou promoção de saúde.
Conhecido no país como Carga Global de Doença (Global Burden Disease), o GBD, na sigla em inglês, é um índice que avalia riscos de mortalidade e impactos à qualidade de vida e à saúde em escala mundial, nacional e regional. A iniciativa é uma parceria do Ministério da Saúde com o Instituto de Métricas e Avaliação em Saúde (Institute for Health Metrics and Evaluation IHME, na sigla em inglês), da Universidade de Washington, a Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz), a Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), o Laboratório Nacional de Computação Científica (LNCC) e o Centro de Estudos Avançados de Governo e Administração Pública da Universidade de Brasília (Ceag/UnB).
Um dos coordenadores globais do cálculo do GBD, o epidemiologista Mohsen Naghavi, do IHME, esteve em agosto no Icict como conferencista e participante do seminário “GBD – Carga Global de Doenças e Big Data em Saúde”, organizado pelo Centro de Estudos do instituto. Em sua passagem pela Fiocruz, o pesquisador discutiu métodos, modelagem de dados e infraestrutura de big data, metodologia que permite a análise de grandes volumes de dados, estruturados e não estruturados, processados de forma paralelizada e distribuída.
Um dos aspectos interessantes do GBD é que o índice coloca em perspectiva dados absolutos de mortalidade ou morbidade, e oferece previsões de tendências com o objetivo de apontar caminhos para possíveis intervenções. O índice também auxilia os gestores a medir a eficiência dos gastos em serviços de saúde visando à redução de certos agravos. Entre 2010 e 2013, a iniciativa cresceu expressivamente, contando com um conjunto de pesquisadores que passou de 488 profissionais para 1083.
Além disso, o IHME conta com um comitê científico formado por profissionais de instituições de referência de países dos cinco continentes e também com um conselho consultivo independente, que avalia e aprova todos os produtos resultantes do cálculo GBD. A versão mais recente de indicadores, o estudo GBD 2013, publicado recentemente, cobre 188 países e apresenta 301 doenças e 76 fatores de risco, além de mais de 2 mil sequelas relacionadas a problemas de saúde. A cada edição do cálculo, a equipe do GBD revisa e acrescenta dados aos levantamentos anteriores.
Um dos desafios da Fiocruz, representada no projeto GBD Brasil pelo Laboratório de Informação em Saúde (Lis/Icict), será hospedar e liderar todo o processo de apoio tecnológico, governança das bases de dados e visualização das análises da iniciativa. Caberá ao IHME, por intermédio de um acordo de cooperação técnica com o MS, o desenvolvimento das análises subnacionais a partir da compilação da carga de doença no Brasil, de 1980 a 2013.
Na opinião de Marcel Pedroso, pesquisador do Lis e coordenador do Centro de Estudos do Icict, com a realização de cálculos específicos sobre carga de doenças no Brasil será possível a comparação da carga da doença no país com o mundo e, principalmente, a detecção de desigualdades da situação de saúde entre os estados da Federação e entre diferentes grupos populacionais.
“O objetivo do Icict é criar uma Plataforma de Computação Científica e Big Data em Saúde para pesquisadores, docentes e discentes de instituições de ensino e pesquisa, bem como gestores governamentais e a Rede GBD-Brasil”, esclarece Pedroso. Segundo o pesquisador, a iniciativa representa um esforço sistemático de epidemiologia descritiva para quantificar e comparar a magnitude da perda de saúde devido a doenças, lesões e fatores de risco por local, sexo e idade, em pontos específicos do tempo. O Projeto GBD Brasil também vai focalizar a organização dos dados e análises por municípios, ajudando a elaborar o Mapa da Saúde no Brasil.
“Hoje, a quantidade de dados e informações disponíveis no Brasil é enorme e fazer bom uso destes dados é o grande desafio. A multiplicidade e heterogeneidade de fontes de dados têm dificultado e encarecido a análise e tomada de decisões em saúde no país. A criação de uma Plataforma de Computação Científica e Big Data em Saúde poderá ser um ponto de inflexão no sistema de vigilância epidemiológica e para a análise de situação de saúde no Brasil, passo decisivo para a tão desejada integração das fontes de informação”, explicou Marcel Pedroso. Ressaltando a importância da iniciativa brasileira, o epidemiologista e um dos coordenadores do GBD 2013, Mohsen Naghavi, concedeu uma entrevista à Inova Icict durante sua estadia no Rio, para o seminário do Centro de Estudos do instituto.
MN: Atualmente, há cerca de mil colaboradores de diferentes países envolvidos no cálculo do GBD pesquisando diferentes doenças e diferentes níveis de informação por país, e também na coleta e organização dos dados e informações das mais variadas fontes.
MN: Quando começamos a publicar os bancos de dados, a partir do GBD 2010, com diferentes colaboradores e cientistas no comitê diretor, descobrimos que se mudássemos a forma de disponibilização para a comunidade internacional talvez obtivéssemos diferentes resultados. Por isso se discutiu mudanças na metodologia, definições e classificações. Não somos um produto. Somos um serviço público. Nós temos que melhorar nossas estimativas ano a ano. E por isso incluímos mudanças. A partir de 2013, passamos a revisar todos os cálculos anteriores anualmente. Assim, vamos aprimorando a parte técnica, incorporando novos dados e informações.
MN: Nós temos muitos desafios. O primeiro é algo que estamos pensando a respeito há algum tempo, que é fazer novas previsões, como o padrão de doenças realizado em 2014 e 2015, monitorar a dinâmica das doenças em períodos como os próximos 20 anos e entender como foram alteradas a partir de certas políticas públicas. Também queremos correlacionar a carga de doença por país em diferentes níveis locais com outros índices regionais de avaliação da saúde. Estamos sempre buscando novos dados, aperfeiçoando nossos métodos, isso é um desafio permanente.
MN: Sim. Primeiro nós temos as citações em publicações científicas em uma quantidade bastante volumosa, e isso pode ser verificado em diversas bases bibliográficas. Outro ponto é que há muitas discussões entre os países parceiros do IHME com quem estamos realizando estimativas de GBD em níveis subnacionais. Já temos essas estimativas para China, Índia, Brasil, México, Estados Unidos, Reino Unido, Arábia Saudita, Suécia, Quênia e Japão, entre outros que estão em andamento.
MN: Nós vamos estimar a carga de doenças de 2014 e 2015 por estados e estamos nos preparando para disponibilizar esses dados em nossas plataformas de visualização. Iremos publicar artigos e relatórios em parceria com os diferentes parceiros daqui.
MN: Eu afirmo que o Brasil tem uma boa informação. Já conferimos os bancos de dados de seu país e comparamos a modelos de outros países e há uma boa organização e qualidade. O país tem bons sistemas e bancos de dados. Há pontos para aperfeiçoamento, mas em comparação com muitos países, há dados confiáveis.
MN: Eu acredito que a infraestrutura do sistema de saúde é boa, mas ainda desigual entre os diferentes estados, e também entre os municípios. Na minha opinião, o mais importante é que país avalie formas de diminuir essa desigualdade entre essas diferentes localidades. Também penso que é muito importante começar a pensar o cálculo do GBD em nível municipal, como forma de corrigir as distorções inter-regionais. Isso seria de grande ajuda no planejamento para a tomada de decisão na gestão pública de saúde e serviços à sociedade.
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